Sempre pensei em como iria começar a escrever isso. Garanto que todas as vezes em que imaginei, foram de formas diferentes e melhores que esta.
Quando eu tinha 6 anos tive um sonho. Eu deitado dentro de uma grande caixa, toda forrada de linho branco e acabamento dourado. O alívio, a paz de espírito, e a sensação de dever cumprido amanheceram dentro do meu peito naquele dia. Lembro que tinha visto uma cena parecida na televisão alguns dias atrás, e lembro o quanto eu fiquei mexido com aquilo.
Nunca tive muito do que reclamar da vida. Tive os melhores brinquedos. Frequentei os melhores colégios que meus pais podiam pagar (o que não era pouca coisa). Fui muito mimado, falando ao pé da letra. Minha vida sempre foi cheia de gente. Muitos indo, muitos vindo. Troca de colégio, troca de bairro, troca de cidade, e de estado.
Lá pelos 12 anos comecei a desejar coisas. O primeiro beijo; a primeira transa; uma carreira futura decorrente de um belo emprego; uma bela casa; filhos; um alguém. Desejei muito tudo isso, daí certo dia tive o mesmo sonho de seis anos antes, e tudo começou a perder o sentido.
Pra quê eu iria correr atrás de tudo aquilo? Pra que construir um futuro e trabalhar uma vida inteira, se provavelmente irei acabar solitário numa casa para idosos, visto minha falta de capacidade de criar afeto e laços mais fortes. Eu provavelmente nunca irei casar, nunca irei ter filhos. Poderia ter uma bela casa, mas pra que? Foi nesse dia que meu sonho começou a fazer sentido de uma forma tão arrebatadora que de certa forma chegava à assustar. No sonho, eu estava morto, deitado em um caixão. Um semblante sereno estampado no rosto. Bochechas murchas. Mãos sob o peito.
Confesso que muitas vezes já tentei adiantar esse sonho e nunca tive sucesso. Nem sei se um dia terei. Ando cansado. Cansado de tentar, de levantar todos os dias numa rotina estressante e sem motivação alguma. Ando cansado de sonhar com um futuro que nunca vai chegar. Cansado de querer. Cansado.
A verdade é que os dias dentro de mim andam turbulentos. Na verdade, nunca foram tranquilos. Tenho tido que lutar contra mim para levantar todo dia da cama pra tentar fazer minha vida fazer algum sentido.
Sinto um frio no peito que nunca foi sanado. Sonho com o dia em que o frio sairá do meu peito e tomará conta de todo o resto. Corpo, alma, coração. O dia do alívio. Hoje ou amanhã, não sei. Pode ser que esteja ocorrendo nesse exato minuto, resta saber quando vem a tempestade mais forte que vai me aniquilar. Carregando...