sexta-feira, 14 de outubro de 2016

Ritual

Era noite. Mais uma noite. Mais uma tristeza. Mais um choro. Mais um.
Ele já era acostumado à isso. Já fizera várias outras vezes. Foi pra beirada, olhou alguns minutos para a imensidão abaixo e longe. Depois passou mais um par de minutos olhando o horizonte.
Sentou-se. Tirou os sapatos, como de costume, e as moedas dos bolsos. Tirou também o último cigarro que tinha. Fumou.
Procurou pela saída, mas essa nunca deu as caras, e dessa vez não fora diferente. Respirou fundo. Lembrou-se das tentativas passadas, e dos fracassos. Visualizou no celular, as imagens dos rostos felizes que ele tanto amava. O mesmo aperto no peito das outras vezes. O mesmo choro. Largou o celular sob as moedas que estavam junto aos sapatos no chão.
Levantou-se. Só queria se atirar dali, acabar com tudo aquilo. Acabar com o fracasso, porém fracassara mais uma vez. Desistira de desistir, não era forte o bastante pra isso. Ainda

Oculto

Esse texto é mais pra um desabafo pessoal do que um dos meus textos de costume. Fiquem avisados.

Era esse momento que eu sempre temi. A minha indiferença com a vida e com tudo.
Sempre fui esforçado em minhas coisas. Um bom aluno, bom filho, bom amigo, e muito modesto. Porém nos últimos anos algumas coisas foram tomando outros rumos. Já não moro mais na antiga casa, já não tenho os mesmos amigos, porém não desmereço os atuais, eles são incríveis; mas de um tempo pra cá as ambições de outrora já não parecem lá muito atraentes. Sempre fui ciente da constante mudança do bicho homem, mas mudei drasticamente. Me sinto culpado por não querer algumas coisas que já quis muito, e por querer coisas que eram fora cogitação à algum tempo atrás.
Ando em processo de redescobrimento, mas temo que seja assim pra sempre. Até quando? Não gosto de rotina, porém também não gosto de mudanças drásticas, gosto de equilíbrio porém ele já não é mais o mesmo. Meus textos já não são mais os mesmos. Minha cabeça também não.
No final das contas isso tudo deve ser apenas viver. Coisa que o menino-morto talvez esteja começando a descobrir como se faz.

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Explicando a depressão (texto Sabrina Benaim *adaptado)



“Mãe, minha depressão é uma metamorfose; um dia ela é tão pequena quanto um vagalume ma palma da pata de um urso, no outro dia ela é o próprio urso. Nestes dias eu finjo estar morto até que o urso me deixa em paz. Eu chamo os dias ruins de “dias sombrios”.

Minha mãe diz: “Tente acender algumas velas”, mas quando eu vejo uma vela, eu vejo o brilho e o tremular da chama, faíscas de uma memória mais jovem que o meio-dia, eu estou em pé ao lado de seu caixão aberto. Este é o momento em que eu aprendo que todos que eu virei a conhecer na vida irão um dia morrer. Além disto, mãe, eu não tenho medo do escuro. Talvez isto seja parte do problema.


Minha mãe diz: “Eu achava que o problema era que você não consegue sair da cama”. E eu não consigo; a ansiedade me aprisiona como um refém dentro de minha própria casa, dentro de minha própria mente. Minha mãe diz “de onde vem a ansiedade?”. A ansiedade é o primo vindo de outra cidade me visitar. Primo cujo a depressão sente-se obrigada a convidar para a festa. Mãe, eu sou a festa. Somente eu sou uma festa cuja eu mesmo não quero estar.


Minha mãe diz: “Por que você não tenta ir para festas de verdade, ver seus amigos?” Claro, eu faço planos, eu faço planos, mas eu não quero ir. Eu faço planos porque eu sei que eu deveria querer ir. Eu sei que algumas vezes eu teria que querer ir. É que não é tão agradável se divertir quando você não quer se divertir, mãe. Veja você, mãe, toda noite a insônia me varre em seus braços, mergulha-me na cozinha, no pequeno brilho da luz do fogão. A insônia tem este jeito romântico de fazer com que a lua sinta-se como a perfeita companhia. Minha mãe diz: “Tente contar carneirinhos”, mas minha mente só consegue contar razões para continuar acordado. Então eu saio para caminhar, mas meus joelhos gaguejantes tinem como colheres de prata seguradas por braços fortes e pulsos fraquejantes. Eles soam em meus ouvidos como sinos desajeitados de uma catedral lembrando-me que eu estou a errar sonâmbulo em um mar de felicidades cujo eu não posso me banhar em batismo. Minha mãe diz: “Felicidade é uma decisão”, mas minha felicidade é como um buraco, como um ovo espetado. Minha felicidade é como uma febre alta que irá passar.


Minha mãe diz: “Eu sou muito boa em fazer coisas do nada” e então rapidamente me pergunta se eu tenho medo de um dia morrer. Não! Eu tenho medo de viver! Mãe, eu sou sozinho. E acho que eu aprendi isto; como transformar angústia em solidão, a solidão em ocupação, então, quando eu te digo que eu tenho estado super ocupado ultimamente, eu quero dizer que eu tenho caído adormecido de tanto assistir o canal de esportes no sofá para evitar o confronto com o lado vazio da minha cama, mas minha depressão sempre me arrasta de volta pra minha cama até que meus ossos se tornem fósseis do esqueleto de uma cidade submersa e minha boca um quintal ósseo de dentes quebrados por morderem-se uns contra os outros.


O oco auditório do meu peito desfalece com os ecos de um batimento cardíaco. Mas eu sou apenas um turista descuidado aqui. Eu nunca realmente vou saber por onde eu tenho estado. Minha mãe continua não entendendo. Mãe, você não entende que eu também não consigo entender?“


quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Intervalo

Cá estamos nós mais uma vez. Sofrendo por ter distância, por ter saudade, e por vezes ausência.
Distanciamento é algo complicado.
Quando duas pessoas estão juntas, convivendo pessoalmente ou não, e se amam, é complicado pensar em distância. Mas a vida não é fácil, e ninguém disse que seria. A vida não tem pena, e não para por ninguém.
Problemas surgem. Problemas familiares, na faculdade, no trabalho, problemas consigo mesmo. Parar e pensar na vida as vezes é necessário, é saudável.
Incompreensão e falta de empatia geralmente levam interações e relacionamentos pra níveis complexos de lidar. O segredo de tudo isso é saber que não é só você que fica mal. E não é só você que as vezes precisa tirar um tempo pra si. Pode ser um dia, ou um ano, não faz diferença. As vezes se afastar faz bem.
Cobrar e julgar terceiros por você achar que está abandonado chega , de certa forma, a ser egoísmo. Você precisa de um tempo as vezes, seu melhor amigo precisa de um tempo as vezes, seu namorado, seu cachorro, sua mãe. Amar é saber lidar de forma madura com tudo isso. É se colocar no lugar do outro. É perceber que o tempo é injusto. É nunca deixar de acreditar no que um dia foi constante mas que agora, por algum motivo, veio a se tornar diferente. É lembrar dos momentos e conversar boas, e guardar tudo isso para quando a pessoa voltar, termos à que celebrar e rir. É não deixar cair na indiferença. Distância vezes é necessário, mas sentir indiferença à pessoa por ter simplesmente se afastado é idiotice. A vida anda, o segredo está em saber receber de braços abertos quem retorna, nunca se sabe o que o outro passou. Torne-se único à alguém, não tem distância e tempo que altere isso.

quinta-feira, 14 de abril de 2016

O menino morto


Menino morto, do olhar vazio, madrugadas em claro, das lágrimas no travesseiro.
Menino morto, da alma gélida, coração sangrante, do sangue na pele.
Menino morto, dos cigarros de fuga, bebedeiras de esquecimento, das ressacas de lembrança.
Menino morto, da sexualidade afirmada, das brigas vigorosas com a família, dos festivais de drogas constantes.
Menino morto, que voara alto, caíra num piscar de olhos, estatelou-se.
Menino morto que um dia sonhara em ter um pouco, conquistara um tanto, desistira de tudo.
Morrera desde então.

quinta-feira, 7 de abril de 2016

Escarlate



É difícil de explicar, a dor que costumo sentir é mais forte do que a vontade do viver. É tão profunda e maior que eu, que precisa ser posta para fora, é necessário. Transferência de dores nessas horas só parece algo banal, algo de alguém que só quer atenção, mas está longe disso.
Grito nenhum resolveu, choro nenhum amenizou, já rezei aos céus, já pedi inúmeras vezes pra que passasse, só eu sei o quanto já pedi, mas ela sempre esteve lá. Ora na lágrima que escorreu dentro do ônibus na volta pra casa, ora nas noites em claro enterrando meu rosto em travesseiros para abafar o som do pranto.
Já tentei ser apático quanto a isto, mas ela, a dor, sempre está lá. Cutucando, subindo em minhas costas, gritando nos meus ouvidos um grito que só eu ouço. Agonia, cansa, desespera.
Liberar o líquido escarlate que corre e pulsa dentro das minhas veias me faz transferir a dor, esquecer, me purificar, me punir.
Por um momento esqueço a dor emocional, o “querer morrer”, e me foco na dor física que sinto enquanto observo o sangue sair das fendas recém-abertas e escorrer por meu braço. Pingando.
Cortando-me sinto-me mais puro, mais justo por punir alguém que nunca quis machucar ninguém, mas que sempre acaba machucando e adoece à todos a sua volta, afeta as pessoas que mais ama e que mais lhe amam.
Cortar-me é uma forma de libertação, de perdoar a mim. Mesmo que aos olhos de terceiros pareça loucura e um ato desnecessário.
Por vezes o corte é tão profundo, que o “querer morrer” só viria como um bônus. Mas para alguém que já não tem cartas no jogo, arriscar tudo não passa de um mero ato de desespero.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Deixe morrer




Fluiu, passou, doeu, feriu. Começou a sumir, evanescer, evaporar, sair de vista pouco a pouco, até que um dia não se enxergou mais.  Deixe morrer e caia fora da minha mente
O momento que outrora parecia besteira fora na realidade a cartada final. Tudo fora momento, passagem, empolgação, passou... Passou.  Deixe morrer e caia fora da minha mente
A tragédia começou no primeiro brilho do coração. Nós não nos víamos olho a olho. Não nos escutávamos ouvido a ouvido. Deixe morrer e caia fora da minha mente.
A parte mais triste não é o final tanto quanto o começo. Deixe morrer e caia fora da minha mente.

domingo, 3 de abril de 2016

Primeiro round



Felicidade. A partir de onde vale a pena ir buscá-la? Até que ponto se pode chegar para tentar alcançá-la?
Recentemente desenvolvi um quadro de depressão aguda. Muita gente com quem convivo não sabe, mas na realidade sempre tive um grau leve de depressão, porém nesses últimos meses ela veio de uma forma mais intensa.É difícil viver em constante crise consigo, a luta é constante.
Luto contra o meu corpo, que insiste em definhar em uma cama e ainda assim me privar das noites de sono tranquilo.
Luto contra meu emocional, que me traz um vazio tão grande e intenso que nenhum choro, grito ou corte pode resolver ou amenizar.
Luto contra minha mente, que tenta a todo custo melhorar, mas ao mesmo tempo traz-me a sensação de culpa por atingir pessoas a quem amo, e por consequência adoecê-las junto comigo.
Pouca gente entende de fato como é viver com depressão. Muitos tratam como frescura. Outros te tratam como louco. Busco apenas forças. Forças pra continuar seguindo. Motivos para não parar.
“E pra onde quer que eu fuja, eu me encontrarei. A luta será constante e eterna, e ninguém escutará a minha dor”