É difícil de explicar, a dor que costumo sentir é mais forte
do que a vontade do viver. É tão profunda e maior que eu, que precisa ser posta
para fora, é necessário. Transferência de dores nessas horas só parece algo
banal, algo de alguém que só quer atenção, mas está longe disso.
Grito nenhum resolveu, choro nenhum amenizou, já rezei aos céus,
já pedi inúmeras vezes pra que passasse, só eu sei o quanto já pedi, mas ela
sempre esteve lá. Ora na lágrima que escorreu dentro do ônibus na volta pra
casa, ora nas noites em claro enterrando meu rosto em travesseiros para abafar o
som do pranto.
Já tentei ser apático quanto a isto, mas ela, a dor, sempre
está lá. Cutucando, subindo em minhas costas, gritando nos meus ouvidos um
grito que só eu ouço. Agonia, cansa, desespera.
Liberar o líquido escarlate que corre e pulsa dentro das
minhas veias me faz transferir a dor, esquecer, me purificar, me punir.
Por um
momento esqueço a dor emocional, o “querer morrer”, e me foco na dor física que
sinto enquanto observo o sangue sair das fendas recém-abertas e escorrer por meu braço. Pingando.
Cortando-me sinto-me mais puro, mais justo por punir alguém que
nunca quis machucar ninguém, mas que sempre acaba machucando e adoece à todos a sua volta, afeta as
pessoas que mais ama e que mais lhe amam.
Cortar-me é uma forma de libertação, de perdoar a mim. Mesmo que aos olhos de terceiros pareça loucura e um ato desnecessário.
Por vezes o corte é tão profundo, que o “querer morrer” só
viria como um bônus. Mas para alguém que já não tem cartas no jogo, arriscar tudo não
passa de um mero ato de desespero.